Nos tempos em que o Cinema era visto em salas de Cinema e não em Centros Comerciais, a rota da Av. da Liberdade que incluía o S. Jorge, o Tivoli, o Éden e o Condes, com um ligeiro desvio ao Politeama e ao Odeon, sem esquecer o Coliseu dos Recreios, era destino obrigatório, pelo menos ao fim-de-semana, para todos aqueles que gostavam de assistir a uma boa sessão cinematográfica.
É óbvio que nos estamos a referir aos lisboetas, dado que a realidade noutros pontos do País irá ser motivo da nossa visita, assim como as salas acima não referenciadas em Lisboa tais como o Monumental, Império, Roma e Alvalade, as quais, graças à sua importância terão que constar neste nosso roteiro pelas salas de Cinema emblemáticas de Portugal e a sua contribuição para o desfrute dos mais belos filmes produzidos em Portugal e no resto do Mundo.
Condes.....As Origens...Os Percursos
O espaço onde existiu durante décadas a sala de Cinema Condes, sito na Praça dos Restauradores e esquina com a Rua dos Condes, em Lisboa, teve como primeira ocupação uma sala de teatro com o nome “Teatro da Rua dos Condes”, nuns terrenos pertencentes, à época, aos Condes de Ericeira, sendo o Arq. Petronio Manzoni (italiano) o responsável pelo projecto.
Face ao seu elevado estado de degradação foi demolido e no mesmo espaço, com dinheiro do comerciante Francisco de Almeida Grandela, o mesmo dos Armazéns do Grandela, em Lisboa, sob o projecto de Dias da Silva e construção a cargo de João Calar, nasceu um novo local de representação de arte cénica, o rebaptizado “Teatro Condes”, cuja inauguração se deu a 23 de Dezembro de 1888 com dois espectáculos, respectivamente “Ontem e Hoje” e a opereta “As Duas Rainhas”, os quais foram antecedidos por um monólogo cuja recita coube ao actor Taborda, tendo sido mais tarde submetido a obras de manutenção e restauro (1898), com o qual ganhou a designação de Teatro Nacional, a par do S. Carlos, disponibilizando para o efeito 920 lugares sentados, os quais foram distribuídos por quatro níveis, respectivamente, plateia, 1º Balcão, 2º Balcão e galeria (galinheiro conforme a interpretação).
No seu palco actuaram companhias estrangeiras e nacionais de nomeada, assim como excelentes elencos de Ópera e Opereta italiana e grandes figuras da cena francesa.
O Teatro Que Virou Sala de Cinema
O espaço que manteve uma actividade teatral regular viu a sua adaptação a sala de Cinema em 1915, devendo-se tal facto aos resultados financeiros negativos entretanto verificados com a actividade até aí levada a efeito, tendo pegado na ideia os donos do então Cinema Olympia, respectivamente Leopoldo O´Donell e Júlio Petra Viana, a que se juntou Carlos Sodré (Companhia dos Tabacos). Contudo, os resultados não foram famosos pelo que entrou em cena, no ano seguinte, a família Castelo Lopes, tendo nessa data adquirido a designação de Cinema Condes (4 de Fevereiro 1916), a qual se manteve até o espaço passar a designar-se por “Hard Rock Café Lisboa”.
Foi durante muitos anos o local de estreia de grandes filmes, estrangeiros e nacionais, destacando-se “O Suicida da Boca do Inferno” (9 de Maio de 1923) de Ernesto Albuquerque, o “Sol e Toiros”, do espanhol José Buchs, projectado pela primeira vez a 29 de Julho de 1949, sendo o consagrado toureiro Manuel de Oliveira o protagonista, com pequenas participações de Amália Rodrigues e Fernanda Baptista, respectivamente com um fado cada.
Ainda, como recordação de uma sala heróica, relembremos a estreia, a 8 de Outubro de 1926, da comédia “O Bicho da Serra de Sintra”, realizado por Artur Costa de Macedo e João de Sousa Fonseca, o qual se baseava em estórias sacadas dos jornais, do tipo sensacionalista envoltas em mistérios.
O Condes foi a sala escolhida para a 16 de Maio de 1947 estrear um dos filmes portugueses de maior sucesso de todos os tempos, com mais do que 200 mil espectadores, ou seja, “Capas Negras”, de Armando de Miranda, o qual esteve em exibição 22 semanas a que se seguiu o tradicional périplo nacional continental, ilhas e ultramar.
Como figuras de cartaz a grande estreia de Amália Rodrigues, o carismático cantor Alberto Ribeiro e ainda Artur Agostinho e Vasco Morgado (pai).
Condes.....Casa Nova
Entretanto, no início da década de 50 o edifício original foi demolido, tendo sido construído no mesmo local a actual estrutura (1951), correspondendo, então, a uma maior exigência a que os novos filmes obrigava, como aconteceu numa primeira fase com o chamado Cinema Panorâmico (sistema Cinemascope) a que se seguiu o inevitável Cinema Estereofónico, dando-se ao espectador melhores condições de conforto como aconteceu com a instalação de cadeiras mais adequadas ao acto de visionamento, ou seja, de poltronas.
Dava-se, ali, a magia do ecrã, tantas vezes referidas por António-Pedro Vasconcelos nas suas crónicas de Cinema, a qual consistia numa sucessão de acções a anteceder a projecção, ou seja, o ding-dong do costume a chamar à sala os espectadores, o apagar suave das luzes da sala a convidar ao silêncio a que se seguia o abrir das cortinas que ocultavam o ecrã branco, e, finalmente, a projecção das mágicas imagens em movimento para deslumbramento de todos aqueles que se disponibilizavam para assistir a um espectáculo cheio de arte e emoções.
Acontece que, contrariamente à grande maioria das salas de Cinema do País, as cortinas do Cinema Condes não abriam de par-em-par, na horizontal, partindo do centro, mas sim na vertical, de baixo para cima, cujos folhos dourados davam aquele toque de requinte numa época, 1952, em que a ida ao Cinema era, também, um importante acto social, ou seja, uma ocasião importante para se mostrar o vestido ou o fato da moda entretanto lançado no estrangeiro pelos costureiros famosos.
Nesta nova configuração do espaço mantiveram-se apenas três níveis dos anteriormente existentes como, Plateia 1º e 2º Balcão, tendo diminuído, por tal razão, o número de lugares, tendo a oferta passado para 892, mantendo-se esta configuração da sala até ao início dos anos 90, época em que a concorrência dos Centros Comerciais se fez sentir, tentando-se o melhoramento do espaço através da instalação de ar condicionado, novos locais onde se montaram bares, sim, porque naquela época havia sempre dois intervalos sendo comum a ida ao bar, mais que não fosse para se passear a indumentária.
Tendo como objectivo final uma maior captação do público que já tinha sido visita frequente do Cinema Condes, procedeu-se, também, à restauração do exterior do edifício, tendo a mesma contribuído para o regresso de algum do tão desejado público que na época dourada do Cinema visto em Portugal, teve no Condes uma das maiores salas de visita, relembrando de memória as fitas da nossa juventude como “Fantomas”, com Jean Marais e Louis de Funès, assim como a longa e divertida série “Le Gendarme” também com o comediante francês Louis de Funès, sem esquecer o marcante “Doze Indomáveis Patifes”, entre outros.
Apesar do esforço empregue na recuperação de um espaço a que os lisboetas se habituaram a frequentar desde muito jovens, acabou por se despedir definitivamente em 1997 enquanto sala de Cinema.
Agora, convertido, desde 2003, no “Hard Rock Café Lisboa”, foi salvo da demolição eminente graças à classificação que recebeu como Imóvel de Interesse Público, pois várias foram as situações que o condenaram, definitivamente, ao desaparecimento.
Fontes:
Bibliográficas: Livro de Manuel Félix Ribeiro “Os Mais Antigos Cinemas de Lisboa 1896-1939” (Edição Cinemateca Nacional-1978); Blogue “Restos de Colecção”, blogue “Cinemas do Paraíso”, blogue Espreitador, “Os Cinemas Em Portugal” de Raul Rodrigues Lima e Fundação Camões.
Fotográficas: Arquivo Fotográfica Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico da Fundação Calouste Gulbenkian e Colorize Media Learning.